Fui de uma geração que conheceu ainda os Salmos e Hinos[1] como o hinário adotado pelas igrejas presbiterianas do Brasil. Para ser sincero, nunca vi nenhuma ênfase dada à importância de se salmodiar, como era próprio dos presbiterianos e reformados de outrora. Porém ainda havia resquícios desta antiga prática Congregacional e Presbiteriana. Vi a transição do hinário Salmos e Hinos para um hinário que quase exclui os salmos, usado hoje pela IPB e com o reforço de cânticos chamados de “espirituais”, muitos deles de autores desconhecidos, de teologia rasa e confusa. Sei que alguns hinos são apenas baseados em algum salmo, ou apenas parte de alguns deles.
Posso dizer que, nascido no final da década de 40, fiquei por mais de 40 anos ignorando o valor que historicamente os calvinistas e presbiterianos do mundo inteiro davam à salmodia. Permaneci tanto tempo na ignorância sem saber que o cantar salmos com gratidão no coração sempre foi uma marca distintiva das igrejas reformadas oriundas da Reforma, especialmente de Calvino[2] e, como a maioria dos presbiterianos, eu não conhecia esta assertiva da Confissão de Fé de Westminster. Não precisamos falar muito para mostrar que o povo cristão “reformado” do Brasil viveu também nesta ignorância, como eu. Quantos líderes de música nas igrejas presbiterianas conhecem a história da salmodia e seu valor? Por que sua Igreja não canta salmos e porque o Brasil não tem saltério até o dia de hoje? Pergunte ao seu pastor e a seus presbíteros. Pergunte por que o piedoso reformador Calvino afirmava: “Não é possível achar melhores ou mais adequados cânticos para esse fim que os Salmos de Davi, inspirados pelo Espírito Santo”. É importante conhecer a resposta, mesmo que isso o entristeça — Em tristeza o coração é quebrantado.
Hoje sabemos como os reformados valorizavam os salmos, os hinos e os cânticos espirituais de Davi. Hoje já há alguma literatura sendo escrita e traduzida no Brasil sobre o tema. Pequenos grupos têm se organizado ansiosos pela confecção do primeiro saltério Brasileiro mas, infelizmente sem a iniciativa de algum órgão oficial eclesiástico ou mesmo de algum profissional experimentado designado e supervisionado pela Igreja. Para muitos se tornou um sonho ter nas mãos um saltério para o crescimento na piedade e para edificação da Igreja brasileira e dos lares evangélicos, usufruindo da profundidade teológica encontrada nos Salmos e raramente encontrada nos escritos não inspirados. Muitos pais sonham em ver os filhinhos da aliança salmodiando ao Senhor com os cânticos soprados pelo Espírito, e seus velhinhos sendo confortados antes da morte com sua mensagem de esperança.
Philip Schafff, um historiador reformado, assim se expressou: “O cântico de salmos tornou-se essencial para a piedade calvinista. Os protestantes franceses, ao serem levados para a prisão ou para a fogueira, cantavam salmos com tanta veemência que tornou-se proibido por lei cantar salmos e aqueles que persistiam tinham sua língua cortada. O salmo 68 era a Marselhesa huguenote”.
Hoje muitos têm louvado a Deus com estes cânticos inspirados nas igrejas, simpósios, congressos e conferências. Há uma explosão de alegria em muitos corações pelo fato de terem descoberto esta recomendação bíblica e confessional (CFW, Cap. XXI.V). Creio que, pela providência de Deus, muitas igrejas no Brasil já cantam os salmos inclusive igrejas Batistas e Congregacionais. O desejo por esta prática cresce a cada dia e muitos não apenas desejam ser ouvintes, mas praticantes cantores dos salmos.
No entanto, ainda estamos muito longe de uma Reforma cúltica onde as Igrejas Presbiterianas sejam conhecidas pelo zelo no seu louvor congregacional. Mais que isso, muitos líderes estão atemorizados pela possibilidade de que isso venha a acontecer. “Seria um retrocesso”, dizem eles; “seria uma confusão nas igrejas”, advertem; “o que faríamos com nosso hinário e nossos hinos e corinhos tão amados...?, alguns indagam; “temos de ser prudentes e sábios, pois nosso contexto é outro”, concluem, minimizando a assertiva. Isso apenas revela insegurança e temor, uma quase fobia, claramente incompreensível.
Maior temor
Para atemorizar mais ainda, há aqueles que defendem a salmodia exclusiva, e que são vistos como um grupo presbiteriano e reformado radical como se estes, durante 200 anos após a reforma, concebessem uma “errada teologia” da adoração e que hoje se choca frontalmente com a “teologia correta” da igreja contemporânea. Bem, aqui chegamos ao ponto nevrálgico da questão. Este grupo salmodista provoca medo e repulsa no meio presbiteriano a ponto de muitos não admitirem o fato de que é um dever do povo de Deus cantar a Bíblia e não apenas lê-la. Já pensou? É como se dissessem: Nós só queremos ler os salmos e ouvir suas mensagens, mas não cantá-los. Como pode ser isso? Esse receio brota da possibilidade de serem vistos e confundidos com este grupo “puritânico”. Bem, não concordar com salmodia exclusiva é uma coisa, não cantar os salmos é outra coisa. Radicalizar aqui é cair no pecado da reforma radical quando os anabatistas rejeitavam tudo que lembrasse a aparência de romanismo, mesmo que fosse bíblico. Diríamos que eles “jogavam fora a água do banho com a criança e tudo”. Aliás, naquela época muitos chamavam os reformados de católico-romanos, por se assemelharem aos romanistas que incluíam em sua liturgia fixa o cântico dos salmos através dos corais.
O medo continua
Aqui é necessário, também, mencionar aqueles que desejam cantar os salmos, mas não exclusivamente, como é o caso de muitas igrejas fiéis da América e Europa. Estas igrejas procuram cantá-los, mas também cantar hinos supervisionados e teologicamente aprovados pela história e robustos doutrinariamente. O que dizer destas igrejas? Bem é aqui que reside a gravidade da questão. Por quê? Porque, nem mesmo esta postura criteriosa e zelosa é aceita pelos líderes presbiterianos no Brasil, pois o medo da salmodia ainda assim continua. Eles se acham, se não mais sábios, pelo menos mais prudentes e dizem: “Cuidado, tudo começa assim! Começam cantando os salmos e depois só querem cantá-los exclusivamente; o melhor é cortar o mal pela raiz; nada de cantar salmos, pois enfatizam demasiadamente a ira de Deus, fazem imprecações para destruir e matar os inimigos, quebrar seus dentes e suas queixadas; não falam explicitamente de Cristo; sua melodia é estranha, não é de nossa cultura e não agrada aos jovens...; vamos preferir os nossos corinhos baseados em pedaços de salmos e nossos hinos do cancioneiro brasileiro...; vamos fazer uma distinção entre eles e os hinos tradicionais do hinário, pois temos de satisfazer aos jovens e velhos”. Já pensou? Isso vai totalmente de encontro com a história da Reforma. Isso faria estremecer os nossos pais na fé, Lutero, Martin Bucer, Calvino, os Huguenotes, John Knox e miríades de outros heróis da fé. É bom lembrar que “o saltério tornou-se um dos livros mais importantes da reforma”.
Desafio
A liderança eclesiástica de hoje deve se empenhar para que a salmodia volte a ser uma prática nas igrejas históricas, especialmente as presbiterianas. Pastores e presbíteros, que pela graça de Deus, foram impactados com esta verdade histórica e escriturística devem batalhar pela restauração do culto bíblico e reformado, sem receio porque o povo de Deus sempre salmodiou ao Senhor na certeza de que esta é uma ordenança de Deus. Sendo assim, somos desafiados a vencer a timidez considerando que mais importa obedecer a Deus do que aos homens. As Igrejas devem reformar seu culto, sendo esse um dos maiores desafios da igreja contemporânea; a batalha de fazer reforma é uma empreitada que poucos têm coragem de enfrentar. Podemos também lutar implantando congregações com uma estrutura onde se tem ensino, pregação, adoração e liturgia reformados e onde é possível se cantar os salmos. Mas não devemos abrir uma congregação com receio dos comentários, críticas e acusações infundadas. Muitos são tentados a pensar assim: “Que tal, começarmos uma congregação onde de início não somos explicitamente reformados e não se canta salmos, mas aos poucos vamos reformando o culto?”. Bem, já pensou, se criar uma congregação não reformada e com os mesmos vícios cúlticos contemporâneos para depois torná-la reformada? Não nos parece sensato este pensamento. Reformar significa lutar para se reaver o que foi deteriorado pela ignorância e desobediência e não aquilo que se estabelece deliberadamente deteriorado. Porque não começar uma congregação reformada e ir em frente, “reformada sempre reformando”? Por que não travar esta batalha logo no início, para se entrar em “terra santa”?
Maior temor
Para atemorizar mais ainda, há aqueles que defendem a salmodia exclusiva, e que são vistos como um grupo presbiteriano e reformado radical como se estes, durante 200 anos após a reforma, concebessem uma “errada teologia” da adoração e que hoje se choca frontalmente com a “teologia correta” da igreja contemporânea. Bem, aqui chegamos ao ponto nevrálgico da questão. Este grupo salmodista provoca medo e repulsa no meio presbiteriano a ponto de muitos não admitirem o fato de que é um dever do povo de Deus cantar a Bíblia e não apenas lê-la. Já pensou? É como se dissessem: Nós só queremos ler os salmos e ouvir suas mensagens, mas não cantá-los. Como pode ser isso? Esse receio brota da possibilidade de serem vistos e confundidos com este grupo “puritânico”. Bem, não concordar com salmodia exclusiva é uma coisa, não cantar os salmos é outra coisa. Radicalizar aqui é cair no pecado da reforma radical quando os anabatistas rejeitavam tudo que lembrasse a aparência de romanismo, mesmo que fosse bíblico. Diríamos que eles “jogavam fora a água do banho com a criança e tudo”. Aliás, naquela época muitos chamavam os reformados de católico-romanos, por se assemelharem aos romanistas que incluíam em sua liturgia fixa o cântico dos salmos através dos corais.
O medo continua
Aqui é necessário, também, mencionar aqueles que desejam cantar os salmos, mas não exclusivamente, como é o caso de muitas igrejas fiéis da América e Europa. Estas igrejas procuram cantá-los, mas também cantar hinos supervisionados e teologicamente aprovados pela história e robustos doutrinariamente. O que dizer destas igrejas? Bem é aqui que reside a gravidade da questão. Por quê? Porque, nem mesmo esta postura criteriosa e zelosa é aceita pelos líderes presbiterianos no Brasil, pois o medo da salmodia ainda assim continua. Eles se acham, se não mais sábios, pelo menos mais prudentes e dizem: “Cuidado, tudo começa assim! Começam cantando os salmos e depois só querem cantá-los exclusivamente; o melhor é cortar o mal pela raiz; nada de cantar salmos, pois enfatizam demasiadamente a ira de Deus, fazem imprecações para destruir e matar os inimigos, quebrar seus dentes e suas queixadas; não falam explicitamente de Cristo; sua melodia é estranha, não é de nossa cultura e não agrada aos jovens...; vamos preferir os nossos corinhos baseados em pedaços de salmos e nossos hinos do cancioneiro brasileiro...; vamos fazer uma distinção entre eles e os hinos tradicionais do hinário, pois temos de satisfazer aos jovens e velhos”. Já pensou? Isso vai totalmente de encontro com a história da Reforma. Isso faria estremecer os nossos pais na fé, Lutero, Martin Bucer, Calvino, os Huguenotes, John Knox e miríades de outros heróis da fé. É bom lembrar que “o saltério tornou-se um dos livros mais importantes da reforma”.
Desafio
A liderança eclesiástica de hoje deve se empenhar para que a salmodia volte a ser uma prática nas igrejas históricas, especialmente as presbiterianas. Pastores e presbíteros, que pela graça de Deus, foram impactados com esta verdade histórica e escriturística devem batalhar pela restauração do culto bíblico e reformado, sem receio porque o povo de Deus sempre salmodiou ao Senhor na certeza de que esta é uma ordenança de Deus. Sendo assim, somos desafiados a vencer a timidez considerando que mais importa obedecer a Deus do que aos homens. As Igrejas devem reformar seu culto, sendo esse um dos maiores desafios da igreja contemporânea; a batalha de fazer reforma é uma empreitada que poucos têm coragem de enfrentar. Podemos também lutar implantando congregações com uma estrutura onde se tem ensino, pregação, adoração e liturgia reformados e onde é possível se cantar os salmos. Mas não devemos abrir uma congregação com receio dos comentários, críticas e acusações infundadas. Muitos são tentados a pensar assim: “Que tal, começarmos uma congregação onde de início não somos explicitamente reformados e não se canta salmos, mas aos poucos vamos reformando o culto?”. Bem, já pensou, se criar uma congregação não reformada e com os mesmos vícios cúlticos contemporâneos para depois torná-la reformada? Não nos parece sensato este pensamento. Reformar significa lutar para se reaver o que foi deteriorado pela ignorância e desobediência e não aquilo que se estabelece deliberadamente deteriorado. Porque não começar uma congregação reformada e ir em frente, “reformada sempre reformando”? Por que não travar esta batalha logo no início, para se entrar em “terra santa”?
Bem, sei que estas minhas palavras podem ser polêmicas e críticas, mas não desejo criticar para destruir, e sim advertir e encorajar. O Senhor é o meu juiz. Se alguém não concorda com a salmodia exclusiva, deve, pelo menos, e no mínimo, concordar com os reformadores e cantar os hinos de Sião. Deve cantá-los com alegria e gratidão no coração; cantar com a família, com seus filhos e netos e contribuir para o Reino de Deus nesta e em outras gerações. Os salmos não foram feitos apenas para serem lidos, mas também para serem cantados como Jesus cantou, e também os apóstolos, e a igreja primitiva, e os pais da Igreja (Agostinho), e os reformadores e também os primeiros presbiterianos o fizeram sem temor.
Cante os Salmos sem medo e rejeição, mas com gratidão a Deus e obedecendo à Sua Palavra!
“Mas também, se padecerdes por amor da justiça, sois bem-aventurados. E não temais com medo deles, nem vos turbeis” (1 Pedro 3:14).
[1] A coleção Salmos e Hinos, foi organizada pelo casal Dr. Robert Reid Kalley e Sarah Poulton Kalley, fundadores da Igreja Evangélica Fluminense, a primeira igreja evangélica em lingua portuguesa no Brasil no ano de 1855. Com salmos parafraseados e hinos, foi usada pela primeira vez em 17 de novembro de 1861, seis anos depois de sua chegada ao Brasil. Esta coleção foi a primeira coletânea de hinos evangélicos em lingua portuguesa organizada no Brasil. Também foi primeiro hinário usado por diversas denominações.
[2] “Os salmos nos incitam a louvar a Deus, orar a ele, meditar nas suas obras a fim de que os amemos, temamos, honremos e o glorificamos. O que Santo Agostinho diz é totalmente verdade; a pessoa não pode cantar nada mais digno de Deus do que aquilo que recebermos dele” (Calvino).